Lea Michele tem conciência da pressão que recaiu sobre ela

Há quinze anos atrás, Lea Michele, estava amuada em seu camarim em Spring Awakening, devastada por causa de um garoto, quando o então diretor do show da Broadway  deu um conselho a ela.

O diretor, Michael Mayer, sugeriu que ele assistisse Funny Girl, que, ele explicou, era sobre uma cantora que aprende a não deixar que nenhum homem impeça o seu sucesso.

“Eu falei isso como uma forma de conforto”, Michael disse em uma entrevista pelo telefone no mês passado. “Você tem uma carreira incrível, você é a atriz principal nesse ótimo musical, e você ainda é nova.”

Lea Michele assistiu ao filme naquele noite. Deslumbrada, ela assistiu de novo na noite seguinte, e decidiu que um dia ela interpretaria o papel principal de Fanny Brice. Algumas semanas depois, ela discutiu sobre Funny Girl e a estrela do filme, Barbra Streisand, em um jantar com o produtor de televisão Ryan Murphy, quem então criou a nova série Glee, pensando nela.

Foi aí que tudo se tornou real: interpretando a capitã do Glee Club, quem se formou e começou a carreira de atriz, a personagem de Lea Michele conseguiu seu papel dos sonhos no primeiro revival de Funny Girl desde sua estreia em 1964.

O plano de Ryan de transferir a Fanny Brice de Lea Michele da televisão para os palcos nunca se concretizou. Mas na terça-feira, o que se parece muito com a vida imitando a arte acontecerá na primeira performance de Lea Michele como Fanny Brice, uma artista judaica do século 20, no August Wilson Theater.

Assim como s duas outras atrizes que estiveram no papel principal esse ano (primeiro Beanie Feldstein, e depois Julie Benko), Lea Michele precisa tentar evitar a ficar na sombra de Streisand, quem esteve na montagem original do musical e no filme.

Diferente das outras atrizes, Lea Michele, de 36 anos, ainda tem que lidar com outra sombra: seu passado. Há dois anos atrás ela enfrentou uma onde de críticas por parte de seus colegas de elenco ao ser publicamente acusada de bullyng por sua atitude no set de Glee. E ela está entrando em um musical onde os bastidores e as trocas de elenco tem sido motivos de fofocas na Broadway esse verão, chamando atenção e cobertura da mídia.

“Eu me sinto mais preparada do que nunca, tanto no âmbito pessoal quanto no profissional”, Lea disse em uma entrevista, três semanas antes da estreia dela. Ela falou do camarim que havia acabado de ser desocupado pela atriz Jane Lynch, quem terminou sua temporada como a mãe de Fanny Brice antes do planejado, o que causou com que as atrizes nunca estivessem juntas nos palcos.

As alegações causaram uma intenção reflexão sobre a conduta dela no ambiente de trabalho, disse Lea, o que ela acredita a ter preparado para ser parte, e a atriz principal, de uma companhia da Broadway pela primeira vez desde que ela saiu de Spring Awakening em 2008.

“Eu realmente entendo a importância e o valor de ser a atriz principal agora,” ela disse. “Isso não significa só ir lá e fazer um bom trabalho na frente das câmeras, mas também por trás delas. E isso nem sempre foi o mais importante para mim.”

Para Lea Michele, quem temporariamente se afastou dos shows após o nascimento de seu filho, Ever, em 2020, a reação explosiva da internet ao anuncio dela em Funny Girls não foi, talvez, bem a volta dela à Broadway que ela esperava.

Antes da notícia, Beanie, quem em geral recebeu críticas desapontadoras, disse no Instagram em julho que ela sairia do show dois meses antes do esperado, escrevendo que a produção “decidiu levar o show em por um outro caminho.” O anuncio aumentou as especulações de que a saída de Beanie teria algo a ver com Lea Michele, quem os rumores diziam que assumiria o papel.

Repressões a Lea Michele voltaram a tona na internet, com alguém questionando se ela deveria ou não ter recebido a oferta do papel.

Voltando a junho de 2020: Depois que Lea Michele tuitou uma mensagem sobre a hashtag Black Lives Matter, Samanta Marie Ware, uma atriz negra que apareceu em Glee, disse que Lea deveria ser responsabilizada por “traumáticas micro-agressões” causadas a ela, dizendo que Lea teria ameaçado causar a demissão dela e a humilhou em frente aos colegas de elenco.

Uma onda de críticas seguiram, incluindo a atriz de Glee que descreveu Lea como excludente e humilhante em frente aos colegas. E a marca alimentícia HelloFresh, dizendo “nós não apoiamos racismo ou discriminação de nenhuma forma“, ao terminar a parceria com ela.

Outra colega do elenco de Glee, Heather Morris, tuitou na época que foi bem desagradável trabalhar com Lea, e escreveu que “por a Lea ter tratado os outros com desrespeito por tanto tempo como ela fez, eu acredito que ela tenha que sofrer as consequências“. (Heather não respondeu ao pedido de uma entrevista)

Lea Michele se desculpou em 2020 pelo seu comportamento. Em uma entrevista no mês passado, ela se recusou a falar sobre as declarações de Samanta, ao dizer que ela “não sentia a necessidade de falar sobre isso“, para a mídia. Samanta se recusou a comentar sobre, mas logo que o anuncio sobre Lea Michele foi feito, Samanta postou um tuite dizendo, “Sim, a Broadway defende os brancos.” A conta dela deste então está privada.

Lea Michele agora reconhece que a forma dela de trabalhar é intensa, algumas vezes por culpa dela mesma. “Eu tenho essa coisa comigo. Eu trabalho realmente duro. Eu não dou brecha para erros“, ela disse.” Esse nível de perfeccionismo, a pressão para a perfeição, me cria vários pontos cegos.”

Ela mapiou essa psicologia até os dias em que ela uma criança na Broadway, onde, ela disse, as expectativas para as atuações de alto nível algumas vezes a colocavam em uma estado um pouco “robótico“.

A carreira dela como atriz começou inesperadamente quando ela tinha 8 anos, e morava em Tenafly, N.J., com o pai (um judeu que tinha uma rotisseria) e a mãe (uma enfermeira católica). Lea Michele conta que pediram a mãe dela que levasse a filha de uma amiga, cujo pai teve um ataque cardíaco, a uma audição para a produção na Broadway de Les Misérables. Lea insistiu em ir junto, e acabou sendo escolhida para o papel duplo de Pequena Cosette e Pequena Éponine. Com sede de mais, aos 9 anos, Lea entrou no elenco do novo musical Ragtime.

Aos 14 anos, ela conheceu Michael quando ela conseguiu o papel de Wendla em um workshop de Spring Awakening. O papel de uma adolescente explorando seus desejos sexuais, que se passava na Alemanha do século 19, deixando nenhuma dúvida sobre a dedicação dela ao teatro. Lea Michele apanhava com um graveto de seu colega de elenco Jonathan Groff, e quando ela ficou mais velha, mostrou os peitos ao simular sexo no palco.

Jonathan, quem formou fortes laços com Lea durante a produção, se lembra de Lea ficar chateada que a cena poderia causar risadas do público.

“Isso deixaria ela devastava“, ele disse, “como, ‘meu Deus, nós não estamos fazendo isso direito? As pessoas estão rindo.”

Jonathan foi quem convidou Lea para o jantar com Ryan Murphy, preparando o terreno para o papel de Lea em Glee. Aos 22 anos, Lea ficou mundialmente famosa como Rachel Berry, a difícil participante do glee club cujo nome do meio era, Barbra, quem definitivamente era uma diva.

Quando Rachel conseguiu o papel em Funny Girl na série, sua afinidade com o musical já estava concretizada, ela já tinha cantado ‘Don’t Rain On My Parade‘, e do filme ‘My Man‘. Na quinta temporada da série, Rachel cantou ‘I’m the Greatest Star‘ nos palcos da Broadway, com Jane Lynch assistindo da plateia.

Você não pode ser culpado por misturar qual história pertence a Lea e qual pertence a Rachel. ‘Elas praticamente se misturam um pouco‘, Lea disse.

Em um momento de perfeccionismo de Rachel Berry, ela admitiu que durante a turnê de Glee ela pediu que ‘Don’t Rain On My Parade‘ fosse retirada da setlist porque ela tinha cometido um erro durante uma performance ao vivo.

Por trás das cenas Lea Michele disse que ela estava ‘aprendendo sobre vícios‘ enquanto namorou Cory Monteith, seu colega de elenco que teve durante muito tempo problemas com abuso de substâncias. Cory morreu em 2013 por uma mistura de heroína e álcool e isso devastou Lea e outros atores do elenco.

Não muito depois, Lea esteve perto de seu papel dos sonhos quando Ryan conseguiu os direitos para um revival de Funny Girl na Broadway. Foi uma época difícil, disse Lea, ela ficou em dúvida sobre isso porque ela já tinha cantado várias musicas do musical na televisão.

“Eu não sentia que havia algo novo que eu poderia trazer ao musical”, ela disse.

O novo material emocional veio anos depois – quando assim como Fanny fez no segundo ato do musical, Lea se casou e teve um filho.

Os amigos dela começaram a notar as diferenças, Jonathan se lembrou que no casamento dela com Zandy Reich, em 2019, o qual Ryan oficializou, ele contou uma história da primeira vez que ele jantou com o casal. Segundo Jonathan, Ryan literalmente disse, “Aquela foi a primeira vez que eu jantei com Lea onde o assunto principal da conversa não era ela, ou que ela queria fazer em seguida na carreira dela“. (Um representante de Ryan disse que ele estava indisponível para comentar a história)

Lea Michele deu a luz a Ever no ano seguinte, depois de vários meses de uma gravidez complicada. Ele ainda era um bebê quando o time por trás da produção de Londres de Funny Girl estava formando o elenco para transferir para a Broadway. Michael Mayer disse que mesmo que Lea fosse a primeira da lista para ser Fanny, ele sentiu que ela não estava pronta para voltar a trabalhar.

Depois que o musical havia escolhido Beanie, Michael conversou com Lea e explicou a decisão. “Eu disse, ‘Olhe, eu sei que provavelmente isso não é o que você quer ouvir, mas é o que nós estamos fazendo“, Michael se lembra de dizer a Lea.

Em seguida ele adicionou, “Eu adoraria fazer Funny Girl com você algum dia.”

Lea contou que ela não pretendia voltar à Broadway até que em Novembro de 2021, ela se apresentou por uma noite no show de reunião de Spring Awakening. Naquela época ela conversou com Michael e disse que quando Beanie saísse, se eles quisessem uma substituta, ela estaria honrada de ser ela.

Depois do anuncio inicial de Beanie em junho, as engrenagem para que Lea Michele entrasse no musical começaram a rodar, Michael disse. Ele adicionou que ele amou a performance de Beanie e que a apoia 100%. Quando perguntando sobre porque ela decidiu sair mais cedo, ele disse não ter certeza.

“Eu não conversei com ela sobre isso“, Michael disse. “Eu acho que foi difícil para ela saber que ela estava saindo e que alguém pegaria o papel“. (Os representantes de Beanie não responderam os pedidos de comentário)

Michael disse que a contratação de Lea foi relativamente rápida já que ela e Beanie tem o mesmo agente, quem já sabia todos os detalhes sobre o show. Em meados de julho, Lea já estava nas salas de ensaios. Julie tomou conta do papel durante o mês de agosto, com a certeza de que ela fará um show por semana depois que Lea Michele estrear no papel.

Em um dos primeiros dias de Lea com o elenco completo, ela cantou ‘Don’t Rain On My Parade‘ no palco e um dos membros do elenco, Leslie Blake Walker disse que se lembrou de assistir Lea cantar essa música em Glee – aquela foi a primeira exposição de Leslie a ‘Funny Girl‘.

Ao ensaiar ‘Greatest Star’ no palco no mês passado, Lea interpretou a personagem Fanny com uma energia tremenda e chegou mais alto que as duas outras Fannies este ano. A comédia foi o modo dela de levar as coisas ao extremo: agarrando a camisa de Jared Grimes enquanto ela tentava convencer ele de seu talendo, ou subindo no piano, como Michael sugeriu, ficando em partes em cima das teclas.

A estrutura do show em si vai ter algumas mudanças, incluindo uma nova música ‘I’d Rather Be Blue Over You‘ que Streisand cantou no filme.

Lea Michele, assim como suas antecessoras, tem tentado remover a pressão das comparações dizendo, “Eu nunca serei tão boa quando Barbra Streisand“. Seja qual for a música que ela cantar, não será elegível ao Tony, já que só a atriz original da produção, no caso Beanie, pode ser considerada para a premiação.

Mas a pressão nela para salvar o revival desse musical tem sido difícil de ignorar. Michael disse que ele vê isso como uma ‘segunda chance‘ para ‘Funny Girl‘, cuja venda de ingressos tem estado em declinio, caindo para uma média de 760,000 dolares no mês final de Beanie em comparação com os 1.200.000,00 dolares dos dois primeiros meses, de acordo com a Liga da Broadway. Os preços agora estão nas alturas com a estréia de Lea Michele, o ingresso mais caro para a primeira noite dela é mais de 2.600,00 dolares, na próxima quarta.

Apesar de todas as evidencias de seu poder estelar, Lea Michele parece ter conciência de que ela deve evitar ser uma diva.

“Todos aqui tem passado por muita coisa, e eu só tenho que chegar, estar preparada para fazer um bom trabalho e ter respeito pelo fato desse ser o espaço deles”, ela disse.

Um elemento desafiador do processo é que ela teve que aprender sapateado desde o ínicio, praticando com um vídeo de sapateado que uma das coreógrafas do show, Ayodele Casel, mandou para ela. (Depois dessa primeira aula de sapateado, ela disse, que chorou no banheiro, pensando se ela realmente seria capaz de fazer isso, antes que ela pegasse os passos.)

Lea Michele ainda admite que ela está aprendendo a ser publicamente vunerável. O ódio online por ela pode se tornar assustador, e ela tem medo de que se ela responder as críticas – ou ainda que ao bizarro rumor que ela é analfabeta – tudo fique ainda ainda pior;

“Eu estive em Glee todos os dias, eu sabia as minhas falas todos os dias”, ela disse. “Mas tem um rumor online de que eu não sei escrever e nem ler? Isso é tão triste. Realmente é. Eu frequentemente penso que se eu fosse homem, muito disso não aconteceria.”

Nesse momento, Lea disse que ela está focada no que está a frente dela: interpretar esse papel, e dessa vez, fazer isso como esposa e mãe e não como a famosa – e ansiosa pela fama capitã do glee club.

Talvez Rachel Berry ficasse irritada se a performance dela não fosse elegível para um Tony Award, mas no presente, a Lea Michele de hoje insiste que ela não está preocupada com isso.

“Talvez você pense que essa é a maior mentira que eu te disse o dia todo”, Lea disse, usando a forma mais forte da palavra, “Mas realmente eu não me importo com isso. Eu só quero poder interpretar bem esse papel.”

New York Times